Todos a bordo! Cruzeiros aliviam falta de hotéis na COP30 em Belém
Dois cruzeiros se erguem imponentes sobre um porto adormecido na Amazônia Legal, onde cerca de 50 mil pessoas se reunirão a partir de segunda-feira (10) para a conferência climática da ONU.
A AFP visitou o porto fluvial de Outeiro, em Belém do Pará, cercado por comunidades de pescadores que vivem em embarcações — agora ao lado desses hotéis flutuantes — e conversou com alguns de seus hóspedes.
Com capacidade para 6 mil pessoas, os navios vieram da Europa para oferecer espaço adicional aos delegados estrangeiros que se concentram em Belém, uma cidade de 1,4 milhão de habitantes, mais da metade vivendo em favelas.
Alguns hóspedes reclamaram dos compartimentos pequenos e da distância entre o porto de Outeiro e o local da conferência — cerca de 20 quilômetros, o que leva 45 minutos de ônibus.
Outros veem a situação como uma oportunidade única.
"Na maioria das conferências, ficamos hospedados em hotéis ou apartamentos", disse à AFP Bereng Mokete, funcionário da área florestal do Lesoto, enquanto esperava no porto para embarcar em um dos navios pela primeira vez.
"Queríamos algo diferente." Ele espera "lembrar disso para sempre".
Nos meses que antecederam a conferência, com os poucos hotéis de Belém já com reservas esgotadas, os organizadores se apressaram em conseguir hospedagem em casas particulares, universidades e escolas — e depois, nos dois navios.
Os preços dispararam.
– Ironia –
Receber o MSC Seaview e o Costa Diadema exigiu melhorias consideráveis no Terminal Portuário de Outeiro, que custaram 260 milhões de reais, segundo o governo federal.
Os moradores comemoraram o investimento em infraestrutura na cidade, que também ganhou uma ponte ligando ao porto e teve suas ruas repavimentadas.
No entanto, grupos ambientalistas destacaram a ironia de que navios de cruzeiros, grandes consumidores de combustível, emissores de carbono e poluidores da água, hospedem delegados de uma conferência voltada a salvar o planeta.
Alguns questionaram a decisão de realizar a COP30 em Belém.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva insistiu que o evento deveria acontecer na Amazônia, um poderoso símbolo da importância das florestas que absorvem carbono.
Aparentemente irritado com as dúvidas persistentes, Lula disse que os delegados poderiam "dormir sob as estrelas".
Em vez disso, muitos dormirão sobre a água.
"É uma boa experiência", disse José Santoro, que trabalha na logística da conferência para o Brasil.
"Nunca estive em uma coisa dessas (...) o banheiro é um pouco pequeno, mas eu sou uma pessoa grande", observou. "O quarto é muito confortável, a água sai quente e fria, a internet funciona."
– 'Algo bonito' –
Vários delegados da conferência se queixaram à AFP sobre os problemas de hospedagem e os preços, que podem chegar a milhares de reais por quarto.
Michel Omer Laivao, do Ministério do Meio Ambiente de Madagascar, disse que sua delegação estava "relativamente satisfeita" com o apartamento que conseguiu após muito esforço, a uma hora de ônibus do centro de convenções.
"Mas o Brasil tem suas razões (...) Acho que o motivo é que o Brasil quer mostrar a Amazônia. O pulmão do mundo", acrescentou. "É algo bonito. Não é todo dia que se pode ver a Amazônia."
Os preços dos cruzeiros também se mostraram proibitivos para muitos — até 600 dólares (R$ 3,2 mil), segundo delegações participantes —, embora alguns quartos tenham sido reservados para representantes de países pobres a tarifas mais baixas.
O Brasil anunciou contribuições de "atores não governamentais" para financiar três compartimentos gratuitos por delegação de países de baixa renda.
Rosandela Barbosa, diretora de gestão portuária da Companhia Docas do Pará (CDP), disse à AFP que Belém tem uma visão de longo prazo.
Com o cais de atracação de Outeiro ampliado, agora "toda a nossa estrutura estará adequada para receber navios de cruzeiros".
O projeto "ficará como um grande legado para a região (...)" porque haverá "um acréscimo de movimentação das operações portuárias", disse ela, expressando a esperança de um impulso ao turismo.
Barbosa descartou as preocupações ambientais, afirmando que os navios possuem "tecnologia e mecanismos para gerenciar e controlar os combustíveis que utilizam".
Para o hóspede Santoro, os bares, restaurantes e piscinas do navio representam um novo tipo de luxo. Os cassinos, no entanto, estão fechados.
"Acho que eles não querem que as pessoas fiquem lá (no convés)... porque se concentrar na COP é mais importante do que ficar nos navios por diversão", disse.
E.Kaleo--HStB